30.6.06

Arealva




O marcador iluminado do celular indica o horário: 21:35 minutos, estava enojado dessas paredes brancas,desses livros densos, precisava arejar.Paro no bar da esquina de minha casa, compro seis cigarros soltos a dez centavos cada; minhas condições financeiras a muito me privaram dos prazeres do bom tabaco tostado do lucky strike, não me importo, coisas como aluguel e outras dívidas são mais importantes que tragadas, tabaco é tabaco.
O dono do bar apesar de cego de um olho é sempre solícito, me pergunta se a faculdade entrou em recesso, digo-lhe que estamos em greve, ele lamenta, conhece toda a família, antes de mim servira meu avô, minhas tias, minha mãe, não tenho pai.
Saio do bar com o cigarro aceso, as ruas são sujas e mal iluminadas, o frio desagradável faz dueto com meu peito que range insistentemente graças a uma constipação, sigo dobrando vielas até chegar à praça de São Pedro,coincidentemente hoje é dia vinte e nove de junho, dia do santo, beatas e fogos superlotam a pequena praça com iluminação amarelada e opaca, ali costumam se encontrar homossexuais de meia idade em busca de rapazes , encontram-se também rapazes, púberes a procura de dinheiro fácil para drogas, cachorros sarnentos e mendigos, toda a sorte de infelizes.
É preciso continuar, venço a praça pensando em como o micro interiorano acaba por imitar instintivamente o macro das megalópoles, deve ser impressão minha, deve ser...
A garganta começa a raspar, a saliva parece arame farpado cortando a mucosa toda ao descer.Outra impressão que vez ou outra me vem a mente é que as ruas sujas acabaram por contaminar essa gente que não vê ou não entende as coisas,prefiro não pensar nisso, é besteira pensar que minhas alusões vão abrir os olhos deles.Meus amigos estão cuidando de suas vidas a maneira deles, deveria fazer o mesmo, deveria...
Atravesso a ponte que separa meu bairro do centro, o rio já bastante sujo e assoreado continua o mesmo trajeto de quando íamos caçar caranguejos na infância, fora a tanto tempo.
Percebo que estou indo a lugar algum e que é melhor voltar, faço o mesmo caminho de volta e resolvo parar para falar com uns rapazes que estavam na pracinha, fazemos troça a um gay que parece ter se interessado por um de nós ou por todos nós, calculo como essa gente é suja, eles foderiam uns aos outros se pudessem, experiências homossexuais são comum por aqui e as drogas fazem um bom trabalho de encorajamento na mente desses imundos, eles me chamam para fumar um baseado com eles, recuso; maconha decididamente não combina com esse maldito resfriado.
O bar do Paulo Sérgio já está fechado(é esse o nome do sujeito caolho) e um casal de namorados tenta fornicar escondidos sob a sombra de uma árvore, há cachorros latindo por toda a rua, entro em casa, cinco mililitros de berotec e mais um tanto de soro fisiológico no aparelho de inalação, xaropes expectorantes e a Crítica da razão pura serão minha distração em mais uma noite nesse lugar esquecido pelo tempo.

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