O rolê noturno precisa acontecer com todas as precauções que a noite de uma grande cidade sugere, na mochila, goro mocozado, alguns maços de cigarro, moedas de baixo valor, um agasalho para encobrir tudo isso, você precisa de cuidado, vontade, um bom baseado e um bloco de notas.
Eu saí com a desculpa de não ter desculpas para dar e queria caminhar pelo centro; desde o Vale do Anhangabaú até a Sé e já eram umas onze e meia da noite de um dia qualquer sem perspectivas e nada que visualmente valesse a pena, queria apenas perambular vagabundamente sem pressa nem compromisso, isso é o que faz tudo ser como deve ser...
Uma espiga de milho, quase meia-noite e eu atracado com uma espiga de milho; o tipo de coisa que a gente só faz porque quer algo bom mas não pode pagar, idéias vendidas de consumo que aceitamos tacitamente, então o sujeito se presenteia com uma espiga de milho cozida bem ali, na esquina de uma rua movimentada, defumada a monóxido de carbono e o sujeito se sente bem e feliz consigo mesmo.
Apertei um banza dos bons ali no Vale, próximo às estátuas que, iluminadas a noite ficam lindas, mas tinha tanto vadio por ali, tanto nóia que decidi perambular mais para dentro, segui em direção a Sé.
Vinha eu batucando um samba do Cartola na caixa de fósforo, mas havia um estranho fluxo automotivo, sirenes e barulhos que abafavam meu som...mendigos havia por todos os lados e de repente, subitamente, me lembrei que a poucos dias tinham ateado fogo em alguns mendigos na zona norte; assim sendo, batucar numa caixa de fósforos diante daquele mundaréu de indigente não me pareceu a coisa mais sensata, resolvi parar, ali na rua mesmo, debaixo de uma marquise e toquei fogo na ponta do banza.
Sei que até o sistema de ônibus voltar a funcionar e tinha uma verdadeira epopéia sobre a noite no centro, da qual não restou sequer uma palavra que valesse a pena deitar no papel, o melhor de tudo foi, sem dúvidas, batucar no sereno, os sambas do Noel.
(outubro de 2010)
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